o
menino que plantava pássaros
as manhãs floresciam plenas como noites que, exaustas d’escuros, despertam para
a claridade de novos dias. Plenas e livres.
— livres
e renovadas... E os dias não se repetem.
a luz
estende ao chão todo imaginário em lendas... nas sagas em cirandas das sombras
candentes das nuvens.
— lendas!
desenhos mitos... Na linha dos olhos.
bocejos
do sol tangem cores nas tardes — tingem de outonos... Da mancha do chão ao céu em asas d’águas voam
pássaros... tecidas faunas.
— tardes;
tintas águas de polens [aquarelas... O menino brinca.
Aos
passos do menino pelas trilhas, seus olhos absorvem o viver; seus pés em comum
com a terra consagram-se.
A
tudo atento olhos falam à alma, ao espírito de forma singular. Falam seus olhos
a seu espírito como quem colhe pedacinhos de realidade em forma de grão, em
forma de alimento até que, de grão em pão, tenha se saciado. Constituído
mosaico para entendimento da natureza das coisas.
Contemplativo
ao movimento das ramagens das árvores e todo colorido de seus frutos
interpretava o tempo... A criação como coreografia o convidava.
... e das frutas nos galhos às frutas ao chão
... e
dos ventos nas ramas às folhas dançarinas
... e
dos pássaros nos galhos aos voos
... terra,
pássaros, frutos, ramos, ares, sol e todas as noites
O
solo come o fruto
— A semente rasga a terra
A árvore gesta o fruto
— O
pássaro e o fruto
A pluma desce ao solo
— O
pássaro e o sol
... e
o menino brinca de brincar
... e o brincar se investe de criar
A
tudo o menino atento aprendia
... e
do aprendido ao brincar
Brincava
que os pássaros eram frutos
...
furtavam nas ramas seus lugares
— Nas árvores assim os via
E via
suas plumas deitarem ao chão
—
Assim como as frutas-sementes
E
todo mistério segredava às árvores
—
Universo pequenino tão íntimo
Escolhia
a sombra mais gorda
— Como
nuvem tombada ao chão
Suas
mãos conchas miúdas abrem pedacinhos no chão
— Como um sorriso de terra
Com o
espírito pleno de estória
— Todo plantio durava a canção d’uma sobra
... e tirava a cada passo suas sementes
... e
na mente a clareza do amanhã preservado
... e para cada manhã um pássaro novo
... e
prosseguia para cada sorriso o novo plantio
Para
cada espécie de pássaros plantava
... juntamente
com a pluma o menino deitava à covinha um pedacinho de graveto para a verdade
das árvores e soprava um sonho profundo para a vida da semente e a realidade
dos ares.
[...
diferentemente
dos demais frutos que tombavam ao chão, os frutos pássaros caiam em voos para
os céus.
[Paulo de Carvalho]
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