SE DOIS MAIS DOIS... GRUPO DOS 4

SE DOIS MAIS DOIS... GRUPO DOS 4

(Andreia Santos de Carvalho)1


“Se as sementes
Incredulamente encovadas ao solo

Abstraem-se do germinar,

Perdoai-as, pois que em ares inférteis,

Já não sabem a que frutificar...

[a que orvalho chorar]


Se os ventos

Já não fazem mais brisas

Em sons de violinos a soprar,

Perdoai-os, pois que já não sabem,

Em tanto DÓ afinar...

[a que lábios habitarem]


Se os pássaros

Ao desalento de Sua palavra

Insustentáveis, pois, do ar caem.

Perdoai-os, pois que sem o ramo das árvores,

Já não têm onde pousar...

[já não sabem a que cantar]”


(Paulo de Carvalho. CONTRIÇÃO)


Inquietações geradas pelas próprias experiências e observações das formas de ser e estar no mundo - engrenagens produzidas e movidas pelo Homem - fizeram eco em meio ao turbilhão de sons, imagens e ações presentes na sociedade contemporânea. Impulsionaram o encontro de um poeta com um filósofo.

Participação em movimentos artísticos, sociais e políticos; as inúmeras leituras envolvendo fé, paixão, análise e exortação ao longo de sua caminhada e um percurso de Mestrado em Teologia marcam a trajetória de vida do poeta.

A apostasia do discurso religioso para ratificar a fé em Deus e uma certa distância desses movimentos/discursos - Teorias e práticas que visam, unicamente, o controle da vida dos indivíduos – provocou análises contextuais e as considerações produzidas formaram juízos, culminando com a pergunta sobre o que fazer com este conteúdo? O que fazer com os conhecimentos adquiridos ao longo desses anos de vivências e estudos?

A expressão por meio da Poesia foi a resposta encontrada há, aproximadamente, 04 anos. Porém, a pergunta persistiu e se fez ouvir pelo filósofo Emy Ribeiro Martins Neto, cujas indagações acerca da práxis eclesiástica encontraram lugar para as devidas discussões.

A adesão de um psicólogo e um cientista, teve como fruto a formação do "Grupo dos 4", visando a circulação da Palavra em tempos que apregoam o consumismo exacerbado, o imediatismo das ações - principalmente ao que se refere ao alívio das tensões - e o "gasofiláceo das razões"2.

Através da articulação entre as Sagradas Escrituras e a Poesia, Paulo de Carvalho inova com a afirmação de que "Deus é Poesia", e a sua Criação (Natureza) é o mais belo e singular ato poético. E a partir desta afirmação, interroga-nos acerca dos efeitos da civilização sobre a Natureza.

Assim, abre espaço para as enriquecedoras contribuições de José Antonio de Carvalho e Silva e José Glauco Ribeiro Tostes que, preocupados com a dominação da Natureza pelo Homem, a "onipotência tecnológica" e uma concepção de mundo baseado no mecanicismo que transforma os próprios indivíduos em objetos descartáveis, empreenderam diversas pesquisas e estudos.

Deparamo-nos com o Homem lançado ao desamparo através do mesmo discurso que ele encontrou para se proteger dos perigos que a própria civilização nos ameaça, como por exemplo, aquecimento global e suas conseqüências. Pois se, por um lado, o Homem, ao longo da História, avançou em seu controle sobre a natureza com o fim de extrair sua riqueza para a satisfação de necessidades humanas, inclusive à custa de sua destruição, estando a própria ciência e tecnologia - criações humanas - a este serviço; por outro lado, as relações entre os homens, às quais a distribuição da riqueza extraída está submetida, não obtiveram avanços ou progressos similares

Olhares específicos convergem no sentido de compartilhar conhecimentos, incitar ao debate e fomentar a reflexão sobre os acontecimentos presentes como atualização de algo que há muito foi instaurado.

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1Andreia Santos de Carvalho é psicóloga.

2Verso de Paulo de Carvalho em seu poema “Oração em Apostasia”.


04/12/2009

Lançamento do meu 2º livro de poemas, neste sábado 
05 de dezembro de 2009.
Evento: Sarau Literário sob a direção de João Ayres 
e música ao vivo com o grupo Palha de Milho
Horário: 20 hs
Local: Ponto Org. Rua Ministro Otávio Kelly, 231 
Jardim Icaraí - Niterói, RJ

obs: O evento Sarau literário com música ao vivo, cobra uma taxa de colaboração no valor de R$ 12,00






O Autor e Sua Obra
(José Antonio de Carvalho e Silva)1

        Paulo de Carvalho, neste seu segundo livro de poesias (após o seu primeiro trabalho editado, Cantabile, 2007) propõe-se um enorme desafio: articular as sagradas escrituras e a poesia, o sagrado e o profano. E o faz utilizando uma linguagem bastante refinada, enriquecida ainda com belos termos e expressões em latim, próprios da liturgia católica, obtendo um efeito bastante elegante na forma.
        Mas o recurso à liturgia católica não implica num autor adotando um discurso religioso em seus poemas. Não. Deste discurso Paulo de Carvalho apostatou, ele é agora um homem que ratifica sua fé em DEUS, e a surpreender o Homem em sua pequenez e finitude. O poeta desdenha das empreitadas humanas. Em Memento encontramos “Vossos vulgares ofícios/ Revertem-se fugazes/ Pulvis Es Estátua/ Beijai vossos pós”.
        Mais do que meramente vulgares, os ofícios do Homem podem estar a serviço da destruição da natureza, tomada como mero fundo de reserva para satisfação, muito mais do que de suas necessidades, de sua volúpia em consumir. É a natureza acossada pela atitude de desafio própria da técnica que surge belamente ilustrada em Contrição: “Se as sementes/ Incredulamente encovadas ao solo/ Abstraem-se do germinar/ Perdoai-as, pois que em áreas inférteis, já não sabem a que frutificar...” (...) “Se os pássaros/ Ao desalento de sua palavra/ insustentáveis, pois do ar caem/ Perdoai-os, pois que sem o ramo das árvores/ Já não têm onde pousar...”
        A finitude humana está magistralmente colocada em Memento, particularmente em sua estrofe final, na divina advertência: “Memento, Homo, /Quia Pulvis Es,/ Et In Pulverem Reverteris...” (Lembra-te, Homem, que és pó e ao pó retornarás). A volta ao pó se configurará na morte, e é dela que Paulo de Carvalho irá tratar em seu último e um tanto enigmático poema, Tanatos, onde a morte é apresentada não como a sinistra portadora da gadanha a que todos nós nos acostumamos a temer, mas, sim, em sedutoras imagens femininas. A morte como um desejável resgate de nossa miserável condição humana? Um reencontro com a natureza, fêmea da qual estamos apartados nesta era da técnica? Deixemos aos leitores a compreensão que cada um venha a ter destes provocantes versos. 


1 José Antonio de Carvalho e Silva. Psicólogo; autor do livro:
Estresse no Trabalho: Machismo e o Papel da Mulher; Muiraquitã, 2006; RJ.

2 comentários:

  1. Parabéns pelo lançamento do segundo livro, Paulo.
    Vejo que vc. se identifica com a trilha numinosa de Murilo Mendes, um caminho bastante peculiar aqui no Brasil.

    Abraço.

    Ricardo Mainieri

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  2. Obrigado pela presença e apoio.

    Aproveito da lembrança do poeta para:

    Reflexão n°.1


    Ninguém sonha duas vezes o mesmo sonho
    Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio
    Nem ama duas vezes a mesma mulher.
    Deus de onde tudo deriva
    E a circulação e o movimento infinito.


    Ainda não estamos habituados com o mundo
    Nascer é muito comprido.

    _____________
    Grande abraço,

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